Imaginemos a seguinte situação: Ricardo e Joana foram casados por muitos anos sob o regime de comunhão parcial de bens e, após desentendimentos, resolvem pôr fim ao vínculo matrimonial. Durante a união, o casal conquistou um imóvel residencial. Ocorre que, na ocasião do divórcio, deixaram de fazer a partilha do bem e Joana continuou a residir no imóvel, sem a oposição de Ricardo e sem pagar qualquer aluguel a ele. Pergunta-se: é possível que, decorrido o prazo previsto na lei, Joana venha posteriormente requerer a propriedade deste imóvel por meio da usucapião?

 

Primeiramente registra-se que o Código Civil prevê a possibilidade de o casal realizar o divórcio e a discussão sobre a divisão dos bens ficar para um momento posterior, conforme previsto no art. 1.581. Isso porque, por vezes, o casal tem pressa para se divorciar e não querem aguardar as discussões e os trâmites da divisão dos bens. Em resumo, postergam a partilha dos bens para um momento posterior, que pode ser efetivada no próprio processo de divórcio, em ação própria de partilha de bens ou ainda em cartório extrajudicial (por escritura pública).

 

Feito este esclarecimento e voltando para o caso em análise, Joana ficou morando no imóvel comum do casal após o fim do casamento. Joana não pagava aluguel a Ricardo, que, por sua vez, também não exigiu qualquer pagamento de aluguel ou prestação de contas.

 

Decorrido o prazo previsto em lei, Joana buscou reivindicar a propriedade do imóvel exclusivamente para si, por meio da usucapião. Para isso, moveu a referida ação judicial e a questão foi objeto de apreciação pelo Superior Tribunal de Justiça que entendeu que, “dissolvida a sociedade conjugal, o bem imóvel comum do casal rege-se pelas regras relativas ao condomínio, ainda que não realizada a partilha de bens, possuindo legitimidade para usucapir em nome próprio o condômino que exerça a posse por si mesmo, sem nenhuma oposição dos demais coproprietários” (STJ. 3ª Turma. Resp 1840561/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellize, julgado em 03/05/2022).

 

Portanto, observe que a posse exercida por Joana sobre o imóvel era mansa, pacífica e com o intuito de ser a única dona do imóvel. Aliado ao lapso temporal em que ocupou o imóvel e a desídia de Ricardo, coproprietário, foi reconhecida a legitimidade de Joana para usucapir o bem.

 

Em casos análogos, é fundamental a orientação e participação de um advogado especialista para realizar o divórcio e resguardar os direitos do casal, recomendando-se que a partilha de eventuais bens adquiridos se dê no próprio ato do divórcio ou imediatamente após ultimado, orientando-se ainda que os proprietários do imóvel participem ativamente na proteção dos bens.

 

David Roque Dias, associado de Carlos de Souza Advogados, especializado em Direito Civil, Contratos e Assuntos Societários.

 

Fonte: Folha Vitória

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