Uma mulher que manteve relação de proximidade com os filhos biológicos do ex-marido após o divórcio teve a maternidade socioafetiva reconhecida pela 8ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP. A decisão unânime permitiu a inclusão do nome no registro dos três autores da ação.

 

Conforme consta nos autos, após o divórcio, a relação de afetividade foi mantida com os filhos biológicos do ex-marido, autores da ação.

 

Ao avaliar o caso, o relator apontou que o artigo 1.593 do Código Civil prevê parentesco por adoção ou consanguinidade, mas também aqueles de “outra origem”. Afirmou também que, conforme a doutrina, há espaço ao reconhecimento da paternidade desbiologizada.

 

Juridicamente coerente

 

Para Márcia Fidelis Lima, presidente da Comissão Nacional de Notários e Registradores do Instituto Brasileiro de Direito de Família – Ibdfam, o TJSP fundamentou o acórdão com “o que há de mais inclusivo e juridicamente coerente com as realidades contemporâneas acerca das relações familiares, no que se refere aos vínculos de parentesco”.

 

“A posse do estado de filho é a vivência de uma relação fática de filiação, pendente apenas de sua formalização registral. Porque o que estabelece a existência do parentesco dessa natureza é o convívio, um conjunto de comportamentos recíprocos, ostensivos à comunidade em que vivem, verificados normalmente entre outros pais/mães e filhos/filhas”, explica a especialista.

 

Segundo Márcia, não existe um ato ou um instante identificável (por exemplo, o nascimento com vida na consanguinidade) ou juridicamente estabelecido (como a sentença transitada em julgado na adoção) como marco inicial que constitui o parentesco. “Verificada a posse do estado de filho, essa relação será levada a registro.”

 

Ela acrescenta: “atendidos requisitos que permitem a inclusão da filiação no registro de nascimento diretamente perante o registrador civil, dispensa-se, inclusive, ação judicial”.

 

Ação judicial

 

Márcia afirma que o objeto do julgado impôs a intervenção judicial principalmente porque a mãe é falecida, “estando, portanto, impedida de declarar presencialmente, reconhecendo a maternidade”.

 

“Se não fosse esse obstáculo, bastaria o comparecimento de mãe e filhos no Serviço de Registro Civil mais próximo deles para formalizar a maternidade originada de uma relação socioafetiva, nos termos do Provimento 63/2017, com as alterações do Provimento 83/2019, ambos do CNJ”, explica.

 

De acordo com a especialista, o reconhecimento jurídico das relações de afeto como fonte de vínculo de parentesco é um marco no sistema brasileiro de normas que trouxe dignidade para as famílias da vida real. “As pessoas passam a ter como comprovar as suas relações familiares como elas verdadeiramente são, sem que tenham que cumprir critérios legais limitadores do que é legítimo ou ilegítimo na sua configuração familiar perante o Estado e a sociedade.”

 

Leia a íntegra da decisão no Banco de Jurisprudência do Ibdfam (acesso exclusivo para associados).

 

Fonte: Ibdfam

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