Posteriormente à abertura da sucessão, é necessário identificar e fazer um levantamento sobre bens, direitos e obrigações deixados pelo falecido. Além disso, é preciso qualificar os interessados na divisão patrimonial. Caso não exista testamento que estabeleça a forma da partilha, todo o patrimônio líquido será dividido entre os herdeiros do autor da herança, conforme determinação legal. É necessário, também, observar a ordem da vocação hereditária na legislação do Código Civil, no que se refere aos herdeiros legítimos.

Estabelece o art. 1.829 do CC:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III – ao cônjuge sobrevivente;

IV – aos colaterais.

O Código Civil diferencia os herdeiros legítimos facultativos dos herdeiros legítimos necessários. Há uma razão plausível para tal distinção: é que estes últimos não podem ser excluídos da sucessão pela simples vontade do autor da herança, salvo se forem deserdados ou declarados indignos. A lei buscou garantir uma maior proteção aos herdeiros necessários, que são aqueles mais próximos e que formam o cerne familiar, dando-lhes amparo patrimonial ao estabelecer que metade da herança deve ser destinada aos herdeiros necessários.

Comenta Pegoraro (2018, p. 18): “Elucidando sobre os herdeiros chamados como necessários, que são beneficiados com, pelo menos, metade dos bens da herança, representam a parte indisponível do patrimônio, constituindo a sucessão legítima”.

Conforme deixam evidenciados os artigos seguintes do Código Civil (Brasil, 2002):

Art. 1.845. São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge.

Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima.

Art. 1.847. Calcula-se a legítima sobre o valor dos bens existentes na abertura da sucessão, abatidas as dívidas e as despesas do funeral, adicionando-se, em seguida, o valor dos bens sujeitos a colação.

Como bem ressalta Gama (2003, p. 32), os herdeiros necessários, herdeiros legitimários ou reservatórios formam uma espécie de herdeiros legítimos que não podem ser excluídos da sucessão. O patrimônio do testador é dividido em duas partes, parte legítima e parte disponível, sendo a parte legítima pertencente aos herdeiros necessários por imposição da lei. A legítima representa limitação ao testador quando for dispor de seus bens, pois metade de seu patrimônio é a lei que determina o destino. Só em relação à outra metade é que o autor pode escolher a quem será destinado, uma vez observadas as limitações legais.

Já os herdeiros facultativos são considerados parentes mais distantes e por isso podem ser afastados da vocação hereditária, sem precisar justificar o motivo de não os beneficiar, pois apesar de terem legitimidade para herdar, não estão inclusos no rol dos herdeiros necessários. Apenas no caso de o falecido não ter deixado herdeiros necessários é que serão chamados à sucessão os herdeiros facultativos, que são os colaterais até o quarto grau: irmãos, sobrinhos, tios, sobrinhos-netos, tios-avós ou primos.

Cabe mencionar que no rol dos herdeiros necessários entra também o companheiro da união estável. (DIAS, 2021, p. 154). Existindo herdeiros necessários, os colaterais só recebem se forem contemplados em testamento pelo autor da herança.

Na sucessão legítima aplica-se o princípio da preferência de classes. Nela o herdeiro da classe subsequente só herda se não houver herdeiros na classe antecedente. Essa categoria é definida pelo legislador e conhecida também como ab intestato, ou seja, sem testamento.

Quanto aos herdeiros necessários, não há limites para que sejam chamados à sucessão por representação. Têm uma maior proteção quando comparados aos colaterais. Conclui-se que o herdeiro pode ser simultaneamente necessário e legítimo, mas não há herdeiro necessário e facultativo de forma concomitante.

Ainda nessa linha de pensamento, aponta Peixoto (2021, p. 147):

Frisa-se que existem herdeiros legítimos (aqueles designados pela lei) e testamentários (instituídos por disposição de última vontade), também se há de fazer a distinção entre herdeiros necessários (descendentes, ascendentes e cônjuge) e facultativos (colaterais).

Para afastar os herdeiros necessários, que são todos os parentes em linha reta, é necessário que tenham praticado alguns dos atos que justifiquem a indignidade ou deserdação, institutos que serão estudados adiante. Por outro lado, para afastar os herdeiros facultativos havendo herdeiros necessários, deverá o de cujus não os beneficiar em testamento. Caso não existam herdeiros necessários, basta providenciar um testamento dispondo de todos os bens. A legislação brasileira só impede que o autor da herança disponha de todo o patrimônio em testamento quando houver herdeiros necessários, mas não impede a disposição total caso haja apenas herdeiros facultativos.

Cardoso (2020, p. 11) observa:

No processo de inventário existem dois tipos de herdeiros estabelecidos pelo CC. Os necessários estão elencados no artigo 1.845 que são os descendentes, os ascendentes e o cônjuge. Os descendentes são os filhos, netos e bisnetos; enquanto os ascendentes são os pais, avós e bisavós. Esses herdeiros considerados legítimos não podem ser privados dos 50% dos bens deixados pelo de cujus. Este percentual será calculado sobre a herança líquida, ou seja, será feito após a quitação das dívidas e das despesas com o funeral do falecido. Desta forma, os outros 50% será destinado para aquele que o testador deseje que receba tais bens.

Desse modo, herdeiros necessários são aqueles que não podem ser excluídos da sucessão por mera liberalidade do autor da herança. Isso significa que para afastá-los é preciso que o fato seja resultado de ingratidão por parte do sucessor (ROSA; RODRIGUES, 2020, p. 44). A legislação garante que metade do patrimônio do falecido deve ser destinado aos herdeiros necessários; assim a livre disposição testamentária fica reduzida à outra metade.

 EXCLUÍDOS DA SUCESSÃO

A exclusão da sucessão acontece nos casos em que o herdeiro ou legatário são considerados indignos para receber a sua parte da herança. A indignidade é aplicada ao infrator e tem por finalidade prevenir ou punir a prática de atos que são vetados por lei. Penaliza-se o infrator subtraindo-o da herança.

Sobre o tema, lecionam Oliveira e Amorim (2018, p. 55): “A exclusão compulsória do direito à sucessão dá-se nos casos de ingratidão do herdeiro ou legatário, por indignidade ou deserdação”. Para os autores, o que justifica a perda do direito de herança é a punição aplicada ao herdeiro que agiu de forma injusta com o falecido. Devido ao seu comportamento reprovável deu-se a reprimenda, tanto na concepção moral como na legal.

Segundo Martins (2019, p. 34), o Código Civil trata da indignidade no artigo 1.814, e a deserdação nos artigos 1.962 e 1.963. Tanto a deserdação quanto a indignidade servem para viabilizar que o legitimado a suceder não venha a herdar o que, em tese, lhe caberia por direito.

Nesse contexto, interessante mencionar que os institutos aqui tratados não se confundem, a despeito de terem a mesma finalidade: a punição. A pena aplicada aos casos de indignidade decorre por força de lei e não depende do autor da herança. Caso algum dos atos previstos no artigo 1.814 do Código Civil seja praticado, o herdeiro ou legatário será excluído por determinação legal.

O prazo para requerer a propositura da ação de indignidade é de quatro anos, contados da data do falecimento, devendo a ação ser proposta após a abertura da sucessão por quem tenha legítimo interesse na exclusão e, concorrentemente, pelo Ministério Público (OLIVEIRA; AMORIM, 2018, p. 56). O rol do artigo 1.814 é taxativo e não admite interpretação extensiva.

Cabe mencionar, também, que a exclusão é uma punição aplicada ao herdeiro ou legatário e não deve passar para os descendentes dos excluídos, pois seus efeitos são pessoais. Logo, não deve alcançar quem não praticou os atos que deram ensejo a tal punição. Assim sucedem os herdeiros do excluído como se ele morto fosse, conforme preceitua o artigo 1.816 do Código Civil (BRASIL, 2002).

Salientam Oliveira e Amorim (2018, p. 58) que a lei determina que o indigno não terá direito ao usufruto nem à administração dos bens que couberem a seus sucessores na herança. Tampouco receberá de seus filhos a herança da qual foi excluído, caso a eles sobreviva. No entanto, havendo perdão declarado pelo ofendido ao indigno, este se torna reabilitado e poderá suceder na herança.

Estabelecem os artigos seguintes do Código Civil brasileiro sobre o tema:

Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:

I – que houverem sido autores, coautores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;

II – que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;

III – que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.

Art. 1.815. A exclusão do herdeiro ou legatário, em qualquer desses casos de indignidade, será declarada por sentença.

§ 1º O direito de demandar a exclusão do herdeiro ou legatário extingue-se em quatro anos, contados da abertura da sucessão.

§ 2º Na hipótese do inciso I do art. 1.814, o Ministério Público tem legitimidade para demandar a exclusão do herdeiro ou legatário.

Art. 1.816. São pessoais os efeitos da exclusão; os descendentes do herdeiro excluído sucedem, como se ele morto fosse antes da abertura da sucessão.

Parágrafo único. O excluído da sucessão não terá direito ao usufruto ou à administração dos bens que a seus sucessores couberem na herança, nem à sucessão eventual desses bens.

Art. 1.817. São válidas as alienações onerosas de bens hereditários a terceiros de boa-fé, e os atos de administração legalmente praticados pelo herdeiro, antes da sentença de exclusão; mas aos herdeiros subsiste, quando prejudicados, o direito de demandar-lhe perdas e danos.

Parágrafo único. O excluído da sucessão é obrigado a restituir os frutos e rendimentos que dos bens da herança houver percebido, mas tem direito a ser indenizado das despesas com a conservação deles.

Art. 1.818. Aquele que incorreu em atos que determinem a exclusão da herança será admitido a suceder, se o ofendido o tiver expressamente reabilitado em testamento, ou em outro ato autêntico.

Parágrafo único. Não havendo reabilitação expressa, o indigno, contemplado em testamento do ofendido, quando o testador, ao testar, já conhecia a causa da indignidade, pode suceder no limite da disposição testamentária.

No caso da deserdação, segundo a previsão legal, deve ser mencionada em testamento e declarada sua justa causa. Também tem prazo de quatro anos para propor a ação, mas consta do registro de abertura do testamento. O herdeiro instituído ou a quem aproveita deve provar a veracidade da causa manifestada pelo testador. Outro ponto que diferencia esse instrumento da indignidade é o fato de alcançar apenas os herdeiros necessários, além de apresentar um rol mais abrangente de causas que motivam a aplicação da deserdação.

Cumpre salientar o que ensinam Rosa e Rodrigues (2020, p. 90): a deserdação é um ato jurídico, privativo do falecido, em que manifesta sua vontade de excluir determinado herdeiro necessário, afastando-o da legítima por meio de disposição testamentária. Acontece em ação própria movida pelo interessado na exclusão e só se efetiva por meio de sentença judicial (ROSA; RODRIGUES, 2020, p. 91).

Ensinam Rosa e Rodrigues (2020, p. 94) sobre a temática abordada: “A consequência da deserdação, confirmada em juízo, em relação aos demais herdeiros, é a chamada dos descendentes do herdeiro necessário deserdado, que adquirem a respectiva parte da herança em seu lugar, em virtude do direito de representação”.

Nessa esteira é o que giza o disposto no Código Civil:

Art. 1.961. Os herdeiros necessários podem ser privados de sua legítima, ou deserdados, em todos os casos em que podem ser excluídos da sucessão.

Art. 1.962. Além das causas mencionadas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos descendentes por seus ascendentes:

I – ofensa física;

II – injúria grave;

III – relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto;

IV – desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade.

Art. 1.963. Além das causas enumeradas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos ascendentes pelos descendentes:

I – ofensa física;

II – injúria grave;

III – relações ilícitas com a mulher ou companheira do filho ou a do neto, ou com o marido ou companheiro da filha ou o da neta;

IV – desamparo do filho ou neto com deficiência mental ou grave enfermidade.

Art. 1.964. Somente com expressa declaração de causa pode a deserdação ser ordenada em testamento.

Art. 1.965. Ao herdeiro instituído, ou àquele a quem aproveite a deserdação, incumbe provar a veracidade da causa alegada pelo testador.

Parágrafo único. O direito de provar a causa da deserdação extingue-se no prazo de quatro anos, a contar da data da abertura do testamento.

Dessa forma, percebe-se claramente a diferença existente entre a indignidade e a deserdação. Aquela é imposta por lei, é sanção civil aplicada ao herdeiro legítimo, testamentário ou legatário, que agiu de forma injusta com o falecido e que devido ao seu comportamento reprovável foi excluído, sendo privado da herança ou do legado que receberia. Esta, por sua vez, decorre de cláusula testamentária com declaração expressa da causa que deu ensejo à deserdação e alcança somente os herdeiros necessários; apresenta um rol mais abrangente do que as causas de indignidade.

 

Fonte: Ibdfam

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