Um dos temas sensíveis no direito processual civil é a distinção entre os meios processuais dominiais que, amparo no direito de propriedade, podem ser utilizados pelo proprietário (juízo petitório) e os meios processuais possessórios que, com amparo no direito de posse, podem ser utilizados pelo possuidor (juízo possessório).
Uma das tradicionais ações petitórias corresponde a ação demarcatória, cuja legitimidade cabe ao proprietário para obrigar o seu confinante a estremar os respectivos imóveis, fixando-se novos limites entre eles ou aviventando-se os já apagados, adequando-os aos descritos no Registro Imobiliário.
A ação demarcatória é a via processual pela qual o proprietário tem o direito de cercar, murar, ou tapar de qualquer modo o seu imóvel, urbano ou rural, e pode constranger o seu confinante a proceder com ele à demarcação entre os dois imóveis, a aviventar rumos apagados e a renovar os marcos destruídos ou arruinados, nos termos do artigo 1.297 do Código Civil.
A par disso, existe orientação de que não seria cabível a ação demarcatória, quando os imóveis já possuíssem limites de suas divisas. Isso porque, havendo perfeita identificação dos limites, afasta-se a necessidade da ação demarcatória.
Em 27/9/2022, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1.984.013, relator ministro Villas Bôas Cueva, reafirmou o tradicional entendimento de que é cabível a ação demarcatória para que o proprietário venha dirimir a discrepância entre a realidade fática dos marcos divisórios e a constante do registro imobiliário. Decidiu-se, ainda, que a divergência entre os limites existentes nos imóveis e os dados constantes do Cartório de Registro Imobiliário é suficiente para justificar o ajuizamento de ação demarcatória.
A jurisprudência do STJ já assentara, de há muito, que a ação demarcatória seria cabível, mesmo quando definidos os limites divisórios, ainda restando dúvidas sobre sua correção e, principalmente, discordância entre o título de domínio e a realidade (REsp 759.018, relator ministro Luis Felipe Salomão e REsp 60.110, relator ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira).
Sendo assim, mesmo quando existentes os limites divisórios entre os imóveis, o proprietário poderá ajuizar a demanda demarcatória, com o propósito de fazer com que haja a correção dos limites, a fim de adequá-los aos definidos no cartório de registro de imóveis.
De outro lado, a ação demarcatória não se confunde com a ação reivindicatória. Isso porque a ação reivindicatória é a ação posta à disposição do proprietário para requerer a restituição da coisa de quem injustamente a possua ou a detenha. Enquanto que o ponto decisivo a distinguir a demarcatória em relação a reivindicatória é a circunstância de ser imprecisa, indeterminada ou confusa a verdadeira linha de confrontação a ser estabelecida ou restabelecida no imóvel (REsp 1.060.259, relator Raul Araújo).
Portanto, a interpretação adotada no REsp 759.018 afigura-se consentânea não apenas com a instrumentalidade do processo, mas, sobretudo, com o regramento previsto no artigo 1.297 do Código Civil, segundo o qual o proprietário detém direito de ajuizar ação demarcatória, mesmo quando definidos os limites divisórios, remanescendo dúvidas sobre a compatibilidade entre os limites reais e os constantes do cartório de registro de imóveis; isto é, mesmo havendo limites nos imóveis, admite-se o ajuizamento de ação demarcatória para fixar os limites se existe divergência de área entre a realidade e os títulos dominiais.
Fonte: Conjur
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