Se a decisão judicial proferida em ação de rescisão de compra e venda não afeta o direito de propriedade do credor fiduciário do imóvel, não há razão para que ele integre o processo na condição de litisconsorte necessário.

 

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso especial ajuizado por uma incorporadora imobiliária, que foi condenada a rescindir o contrato de compra e venda por vícios no imóvel.

 

O apartamento foi adquirido pelo particular por meio de contrato de alienação fiduciária. Nele, o banco financia o imóvel e fica com a propriedade dele até que a dívida seja quitada por mensalidades. O devedor, enquanto isso, detém apenas a posse e pode usá-lo normalmente.

 

No caso dos autos, a incorporadora entregou o apartamento com atraso e diversas falhas estruturais que levaram ao comprometimento da segurança e habitabilidade do prédio.

 

As instâncias ordinárias condenaram a empresa a devolver todas as parcelas já pagas pelo comprador e a pagar as parcelas restantes do contrato de alienação fiduciária, além de indenizar por danos morais no valor de R$ 30 mil.

 

Para a incorporadora, isso faz com que o banco deva integrar a ação na condição de litisconsorte necessário. O Tribunal de Justiça do Maranhão negou, por entender que a ação em nada tem relação com o contrato de financiamento imobiliário, sendo que nenhuma responsabilidade é imputada à instituição financeira.

 

Relatora no STJ, a ministra Nancy Andrighi manteve a conclusão. Para ela, se a garantia do contrato de alienação fiduciária — o próprio imóvel — está intocada pela ação de rescisão de contrato, não há qualquer violação a direito material do banco.

 

A decisão se limitou a substituir o devedor fiduciante (originalmente, o particular comprador do imóvel) por um terceiro (a incorporadora). “Desta maneira, se a discussão processual não alcança o direito de propriedade do credor fiduciário, este não merecerá figurar como litisconsorte necessário”, concluiu. A votação foi unânime.

 

Impacto no mercado

 

Para a advogada Jéssica Wiedtheuper, especialista em direito imobiliário do escritório Mota Kalume Advogados, apesar de a ministra Nancy Andrighi considerar que a decisão não traz impacto para a instituição financeira, ocorre uma subversão da relação contratual, uma vez que a vendedora passa a ser devedora do banco.

 

Assim, se o pressuposto do julgamento é devolver as partes para o estado anterior à compra do imóvel, a incorporadora sai prejudicada por ser obrigada a quitar o saldo devedor junto ao banco. Para ela, o precedente deve impactar o mercado de negócios imobiliários.

 

“Por mais que o STJ tenha se limitado à análise da questão processual, isto é, a necessidade do litisconsórcio necessário, acabou validando as condenações da construtora, o que tem potencial efeito de desestimular a utilização da garantia de alienação fiduciária”, explicou.

 

“O julgamento tem muito potencial de trazer mudanças para a utilização dos financiamentos imobiliários, sobretudo porque está sendo aguardado o julgamento sobre a possibilidade de aplicação do CDC nos contratos garantidos por alienação fiduciária”, acrescentou.

 

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REsp 1.992.178

 

Fonte: Conjur

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