Tão difícil quanto você conseguir ficar desconectado por, pelo menos, um dia, é você conseguir — de forma objetiva — conceituar em que momento um relacionamento afetivo passa a ter status de família.

 

Ao contrário do imaginário popular, que entende ser necessário um prazo de dois ou anos e a coabitação para que haja união estável, a legislação brasileira exige apenas a existência de um relacionamento público, contínuo e duradouro e com a intenção de constituir família.

 

Ainda, embora o artigo 1.725 do Código Civil estabeleça a possibilidade da realização de contrato escrito para a escolha de regime diverso da comunhão parcial, oportunidade em que os companheiros podem indicar o início da união, sabe-se que a formalização não se verifica enquanto regra na experiência social.

 

Em decorrência dessa ausência de data demarcada documentalmente (o que não acontece no casamento), uma das atividades hercúleas das Varas de Família é conseguir definir em que momento a “ficada”, o namoro, o noivado ou, simplesmente o “crush” virou um relacionamento que possa ter consequências jurídicas e patrimoniais.

 

A falta de critério é tanta que, para alguns, poderíamos ter uma espécie de “namoro qualificado”, fator esse que, em nosso sentir, carece de validade jurídica. Reconhecer alguma relação como “qualificada” tornaria as demais, então, “desqualificadas”? E mais, apenas por amor ao debate, um casal de classe média alta, que teria condições de manter duas casas ao longo da relação, com autonomia financeira entre si, talvez indicasse a presença constante de um “namoro qualificado”, enquanto, no caso da população assistida pela Defensoria Pública, sua relação seria, em regra, uma união estável vez que estaria presente um entrelaçamento econômico?

 

Agora, sobre as provas necessárias para o reconhecimento, para além dessa mistura econômica e a aparência do estado de casados, um forte elemento para a configuração da relação — embora não seja um requisito imprescindível — sempre foi coabitação entre o casal.

 

Ordinariamente, em um mundo analógico, usávamos para esse desiderato comprovantes de correspondências e, até mesmo, a participação ativa de vizinhos do casal.

 

Na atualidade, considerando a experiência que já vem sendo utilizada nas Justiça do Trabalho, a determinação da quebra de sigilo da geolocalização poderia ser uma ferramenta interessante nas ações de reconhecimento de união estável. Ponto para os avanços tecnológicos, que podem, em muito, demonstrar a verdade que norteou o relacionamento afetivo outrora existente.

 

Ao depois, essas informações poderiam também servir para atestar viagens em conjunto e outros espaços de convivência, quando ausentes outras provas desses momentos.

 

Afinal, enquanto antigamente se dizia “quem casa, quer casa”, nas relações convivenciais a demonstração de residência comum ou uma convivência mais intensa pode ser contextualizada a partir das evidências construídas em um mundo cada vez mais conectado.

 

Fonte: Conjur

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