A usucapião garante a aquisição da propriedade de um bem de forma originária, desde que a posse sobre o bem preencha requisitos como ser mansa, pacífica, contínua e duradoura, variando o lapso temporal conforme o caso.

 

Nesse contexto, há uma forma extraordinária de usucapião que desperta receio em quem está passando pelo processo de separação e divisão de bens: a usucapião adquirida em razão do ex-cônjuge ou ex-companheiro ter “abandonado o lar”.

 

Segundo o artigo 1.240-A do Código Civil, os requisitos para essa usucapião são: exercer a posse por 2 anos ininterruptos e sem oposição, de forma direta e exclusiva, sobre imóvel urbano de até 250m², cuja propriedade dividia com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, devendo esse imóvel ser usado para sua moradia ou da família e não podendo ser proprietário de outro imóvel.

 

Recentemente o Superior Tribunal de Justiça – STJ discutiu a temática, analisando a possibilidade de uma ex-cônjuge usucapir o imóvel que dividia no decurso do matrimônio, ainda que não tenha ocorrido a divisão dos bens, no julgamento do Recurso Especial 1.840.561-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 03/05/2022, o qual faz parte do Informativo de Jurisprudência 739.

 

No caso concreto discutido, com o fim do matrimônio, a ex-esposa permaneceu exercendo a posse do imóvel como se dona fosse, enquanto o seu ex-cônjuge abandonou a fração ideal pertencente ao casal. Ainda, a ex-esposa não pagou aluguel para morar no imóvel, nem prestou conta nenhuma por todo o período antecedente ao ajuizamento da ação.

 

O STJ concluiu que é possível a usucapião extraordinária nesse caso, pois o bem imóvel comum do casal possui as mesmas normas relativas ao condomínio, visto que o condômino que exerce a posse sem oposição dos demais coproprietários possui legitimidade para usucapir o bem, observados os outros pressupostos da legislação.

 

Portanto, conclui-se que não é indicado àquele que deseja permanecer com seus direitos relativos ao imóvel simplesmente “abandonar o lar” e não cobrar nenhum valor a título de aluguel ou não buscar o ex-cônjuge para prestação de contas, pois, segundo entende o STJ, a aquisição do imóvel pela usucapião extraordinária entre ex-cônjuges é possível, ainda que antes da divisão dos bens.

 

Doralúcia Azevedo Rodrigues é advogada, procuradora municipal, mestranda em Direito Constitucional

 

Fonte: Diário do Nordeste

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