Em recente decisão unânime, proferida pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, restou decidido ser absolutamente incabível o reconhecimento de uma união estável em simultaneidade com o casamento, bem como ser inadmissível a triação dos bens, mesmo que a referida união estável tenha tido início antes do casamento.

 

Após julgamento de recurso especial — que tramita sob segredo de justiça, e trata sobre a situação onde uma mulher conviveu durante três anos com um homem, antes que ele se casasse com outra, e manteve o relacionamento por mais de vinte e cinco anos. A recorrente, ao reiterar seu pleito ao Egrégio Tribunal, reiterou seu pedido de reconhecimento e dissolução da união estável, enfatizando a questão da partilha dos bens em triação.

 

Houve parcial provimento ao REsp, no sentido em que fora decidido que não há, de fato, um impedimento quando do reconhecimento da união estável no período de convivência anterior à celebração do casamento, todavia, a partir deste alentado momento, a referida união passa a ser revestida com o caráter do concubinato; qual seja, amasiamento.

 

O pleito da requerente fora acolhido, com o consequente reconhecimento por toda estação de convivência da união estável, com a devida partilha em triação. No entanto, o Egrégio Tribunal de Justiça mineiro reformou a referida sentença, no sentindo de entender que o casamento deve prevalecer ao concubinato.

 

A ministra Nancy Andrighi, ora, relatora do REsp em questão, caucionou que em conformidade com a atual jurisprudência brasileira, “(…) é inadmissível o reconhecimento de união estável concomitante ao casamento, na medida em que aquela pressupõe a ausência de impedimentos para o casamento, ou, ao menos, a existência de separação de fato (…)”.

 

Também discorreu acerca do fato da Suprema Corte brasileira ter fixado a tese de que a preexistência de casamento ou de união estável de um dos envolvidos, impedirá o reconhecimento de um novo vínculo, em razão do princípio da monogamia presente em nosso ordenamento jurídico.

 

Neste interim, Andrighi deu por reconhecida a união estável tão somente durante o período de convivência até o casamento, de modo com que a partilha de bens fosse condizente a respeito deste intervalo de tempo, por ser, tipicamente, uma união anterior à Lei nº 9.278 de 1996, que, por sua vez, exige prova do esforço comum de ambos os conviventes quando da aquisição do patrimônio, conforme previsto na Súmula 380 do Supremo Tribunal de Justiça.

 

Fora, inclusive, observado pela ministra relatora, que tratava-se de uma relação que se equipara, de fato, à sociedade, vez que em relação ao período posterior à celebração do matrimônio, a Recorrente e o Recorrido tiveram dois filhos durante o concubinato que durou vinte e cinco anos, e que eram conhecidos por todos os envolvidos. Em razão de tal fato, seria, portanto, perfeitamente possível a partilha de bens neste lapso temporal, novamente, desde que exista a prova do esforço comum.

 

Quando da reforma do acórdão, Andrighi informou que, desde que seja resguardado o direito da esposa à meação, a partilha obrigatoriamente deve ser feita via liquidação de sentença, vez que as demais instâncias não informaram nada sobre o embasamento probatório acerca da participação na construção de patrimônio.

 

Esmerilhando pontos chaves da referida decisão, partiremos do fato de que uma simples significação atribuída ao princípio da monogamia se dá em razão de ser proibir o matrimônio com mais de uma pessoa, e, é definido a fidelidade recíproca do homem para com sua esposa e vice-versa.

 

Pois bem, de imediato, a título de conhecimento, cumpre conceituar que a família representa o núcleo básico da sociedade, sendo ela o resultado da interrelação entre os homens. Ao passo em que, Pontes de Miranda, em seu legado, enumerou acerca da existência de sete processos sociais de adaptação, quais sejam: religioso (piedade, devotamento); moral (o que é ético e o que não é); estético (beleza); gnosiológico (conhecimento sobre as ciências); jurídico (ordem extrínseca); político (ordem intrínseca), e, por fim, o econômico (produção de riqueza).

 

A partir desses sete processos sociais de adaptação acerca da estruturação familiar, prevalecem os de aspecto moral, religioso, econômico, e, consequentemente, o jurídico, que constituem a lídima conceituação de família. Importante adendo ao fato de que Giselda Hironaka entende acerca da existência do fato instintivo, qual seja, aquele que representa a energia sexual e traz o aspecto de relevância ímpar para a análise da família.

 

Breviloquente, dentro do processo evolutivo do homem (selvagem, bárbaro, e civilizado), é possível notar a existência de núcleos familiares. Assim, com o objetivo de identificar com exatidão o protótipo original de família, Pontes de Miranda desenvolveu algumas teorias, dentre elas: a teoria da monogamia originária, a teoria da promiscuidade primitiva e a teoria das uniões transitórias. Ou seja, basicamente, entendia-se que a respeito da união conjugal, a família poderia ser tanto poligâmica, quanto monogâmica, sempre levando em consideração a virit et mulieris coniunctio, ou, podendo ainda ser entre um homem e várias mulheres, ou uma mulher e vários homens — qual seja, poliandria.

 

Assim, se correlacionando ao objeto do presente texto, a teoria da monogamia originária pode ser entendida no sentido de que o amor entre os casados e o amor filial seriam, em sua realidade, dados psicológicos, portanto, uma característica entre os seres humanos. Ao passo em que também pode ser entendida como o fato de que havia à época, uma promiscuidade embutida nas relações, o que acabou resultando na monogamia.

 

Destarte, nos atuais dias, podemos aduzir que a monogamia simplesmente não deixa de existir pelo acometimento de uma reles traição, mas sim, deixa de existir quando do estabelecimento concomitante, ou paralelo, de uma relação afetiva ao casamento ou à união estável.

 

Acerca dos impedimentos matrimoniais, traduzem-se na verdadeira proibição imposta pela legislação à realização de um casamento. As causas impeditivas encontram-se previstas no Artigo 1.521 do Código Civil, e geram a nulidade do casamento. Em seu inciso VI, encontra-se presente o impedimento de pessoas já casadas de se casarem. Ou seja, há a prevalência e a concretização do princípio da monogamia em nosso ordenamento jurídico, que, por sua vez, caso seja quebrada, gerará a nulidade do segundo matrimônio, posto que o vínculo conjugal tão somente se dissolverá via divórcio, morte, nulidade ou ainda anulação do casamento, assim, ninguém poderá se casar novamente sem que a presente relação não seja liquidada.

 

Imperioso destacar, que esta restrição não se aplica à união estável, pois, em conformidade com o disposto no Artigo 1.723, parágrafo 1º do Código Civil, é possível a sua constituição, desde que a pessoa casada pense estar separada de fato ou de direito. Ou seja, é perfeitamente possível que determinada pessoa viva uma união estável reconhecida, desde que esteja separada de fato de seu cônjuge. Alentado adendo ao fato de que, embora essa pessoa possa viver uma união estável reconhecida, não poderá, de modo algum, contrair concomitantemente um segundo casamento. Caso isto ocorra, haverá a pendência da validade do referido casamento, ligada à dissolução judicial ou extrajudicial do primeiro.

 

Note-se que toda a decisão proferida pela ministra Nancy Andrighi se perfez acerca do reconhecimento da união estável durante o período de convivência até o casamento, de modo que a partilha de bens fosse condizente com este lapso temporal, exigindo prova de esforço comum de ambos os conviventes, sem que fosse atingido o patrimônio da cônjuge do casamento posterior, fazendo, então, com que o princípio da monogamia predomine em nossa atual jurisprudência.

 

Fonte: Conjur

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